Incentivo à farda fez com que pai, filhos e neto entrassem na corporação.
Sargentos e soldado Gregório contam histórias sobre a profissão.
Família Gregório serviu e serve a Polícia Militar em Presidente Prudente (Foto: Stephanie Fonseca/G1) |
1º sargento aposentado Benedito Gregório tem 89 anos (Foto: Stephanie Fonseca/G1) |
A cerca de um mês de completar 90 anos e chegando aos 40 de aposentado, Benedito começou a trabalhar antes mesmo da criação da Polícia Militar. Em 1955 ele ingressou na Força Pública e em 24 anos de carreira viu as transformações estruturais da instituição em nossa região e acompanhou de perto a criação do 18º Batalhão da Polícia Militar do Interior (BPM/I) e a construção de sua nova sede, entre 1971 e 1973. Ele ainda vivenciou a criação da corporação, que foi a junção da Força Pública e da Guarda Civil. Além disso, antes, em 1948, serviu o Exército Brasileiro.
Benedito Gregório iniciou a carreira ainda na Força Pública (Foto: Polícia Militar/Divulgação) |
Ao G1, Benedito contou que na época do governo de Jânio Quadros, o policiamento era bem diferente ao dos dias atuais, era de bicicleta, das 22h às 5h. “O serviço meu foi no Cambuci, na Lins de Vasconcelos [em São Paulo]”, disse. “O capitão perguntou se eu estava contente lá. ‘Qualquer lugar pra mim serve. Me dou bem com todo mundo, graças a Deus’. Aí falei que se pudesse vir embora, eu vinha, e ele falou ‘Então espera’. Aí quando deu dia 15 saiu minha transferência e voltei para Prudente de novo”, recordou.
“O tempo que eu cheguei aqui em Prudente, só tinha o jipinho do capitão, mas ele não dirigia, e na delegacia tinha um carro lá que era do médico legista e as ‘meias miquelinas’, um carro de pegar preso, um carro velho também”, relatou ao G1. “Depois, em 62, chegou uma ambulância e um caminhão na companhia”, apontou. Os veículos não tinham motorista e quem os conduzia era Benedito, algumas vezes até antes de ter carteira de habilitação".
O patrulhamento em Presidente Prudente não era de bicicleta. O 1º sargento aposentado acredita que seja pelo tamanho da cidade. “Aqui, naquele tempo, tinha o carrinho de praça, tinha a charrete, para ir na cidade mais longe era charrete”, recordou. “A viatura custou chegar. Mas depois veio a viatura vermelha e preta, era um fusquinha”, contou ao G1.
‘Faz tudo’
Uma das criações que Benedito acompanhou foi a do prédio do 18º BPM/I. A reportagem perguntou: “Então tem suor do senhor ali?” e o aposentado nem pensou: “Ah, não tenha dúvida!”. A sua participação foi no começo, em 1971. “Cheguei a carregar muito material de construção no começo, quando começou o batalhão. Em 72 eu fui pra São Paulo. Estava começando o alicerce”, afirmou.
“Mas eu trabalhei muito na 3ª Companhia, até me chamavam de ‘Benedito Faz Tudo’, porque eu fazia serviço de pedreiro, carpinteiro…”, disse ao G1. Até aplicações de injeções o 1º sargento aposentado já realizou. “Aí passava na casa de um e de outro, de acordo com as horas que era determinado pra gente aplicar”, explicou.
Benedito acompanhou os cinco filhos e agora o neto e disse que houveram algumas mudanças. “Uma das coisas que mudou bem foi o negócio da ‘caxiagem’ [rigor, exigência]. Antigamente, qualquer cabo que passasse perto, o soldado tinha de levantar. Hoje não, acabou essa ‘caxiagem’. No mais acho que é quase tudo a mesma coisa. Respeitar, automaticamente tem que respeitar mesmo, militarismo é assim”, comentou.
Família Gregório serviu e serve a Polícia Militar em Presidente Prudente (Foto: Polícia Militar/Divulgação) |
Conforme contou Benedito, “até os cunhados”. “No começo quando entrei, meu sogro não gostou muito não, falou que era serviço de vagabundo, mas depois os dois filhos dele entraram na Guarda Civil, depois unificou e os dois são tenentes aposentados. Depois meu sobrinho, por parte da minha mulher, o Roberto, meu filho, que hoje é tenente aposentado também, incentivou ele. Meu sobrinho entrou, filho da minha irmã, tenente aposentado. Em São Paulo tem coronel aposentado que é sobrinho meu, que o pai dele entrou por causa de eu ter entrado também”, relatou.
2º sargento aposentado Moacir Gregório atuou em Presidente Prudente(Foto: Polícia Militar/Divulgação) |
“Trabalhei mais em Prudente, sempre na rua, até que chegou o dia de fechar com chave de ouro, que foi a aposentadoria, uma coisa que a gente vai galgando a degraus na vida”, disse. “Mas minha história na polícia é muito boa, muitos companheiros, todos irmãos mesmo, um pelo outro, morre pelo outro se for o caso. Assim, em ocorrência não tive o desprazer de ver colega baleado. A vida foi simplesmente muito boa na carreira policial.
O 2º sargento contou que antigamente havia mais respeito pela polícia. Ele também contou ao G1 que as apreensões também eram diferentes. “Apesar que, trabalhei pouco em São Paulo, quase quatro anos, sempre também na rua, e dificilmente a gente apreendia uma arma automática; Não tinha esse armamento pesado, fuzil, um monte de coisa… Difícil não, não tinha. Então a coisa mudou, mas acredito que ainda tem cura. Quem sabe os nossos administradores veem com bons olhos e acaba mudando um pouco a lei e a gente sai vencedor, favorecer a população de bem num todo, que a vida parece que perdeu o valor, se mata do nada”, declarou.
Em sua carreira, várias ocorrências marcaram Moacir. “Uma delas a gente interceptou aqui, depois da Polícia Rodoviária, um veículo em atitude suspeita e conversamos. Aí logo em seguida passou um caminhão Alfa Romeo, com dois tratores em cima, a gente fez abordagem e separou os indivíduos”, relatou. Conforme O 2º sargento, os abordados caíram em contradição e a polícia conseguiu desvendar um roubo em uma fazenda. “Inclusive, na ocasião, balearam uma mulher grávida na fazenda e a gente conseguiu recuperar tudo ali, o que foi gratificante”, destacou.
Outro fato que marcou a carreira de Moacir foi um acidente entre dois ônibus da Andorinha, em Regente Feijó, em 2006, que matou mais de 30 pessoas. “Nós estávamos saindo de serviço, indo pro quartel, aí o sargento que comandava a equipe falou ‘Acabou de acontecer um acidente. Vamos lá para ver, se precisar a gente faz algum apoio’. Foram todas as viaturas lá, não lembro se cinco ou seis, e prestamos esse apoio lá, vendo aquilo que foi inevitável ver. Realmente, foi um acidente que, na vida minha, não só de polícia, foi o mais grave que vi”, relatou.
Moacir relatou que o cenário era triste, muita viatura e muitas vítimas. “Me lembro que marcou que na cadeira, uma criancinha estava com o rosto tampado. Fui lá descobrir e não tinha face. É um negócio que marca a gente também, a gente ajudou ali na sinalização, segurança… Depois você vem para casa e fica pensando… Policial também é ser humano, carne e osso e tem sentimentos”, disse ao G1.
O 2º sargento também destacou que trabalhou por 31 anos e nunca atendeu ocorrência com familiar, só pessoas estranhas. “Então a gente corre e se arrisca pelos outros, pessoas que dificilmente você terá um grau parentesco. É a carreira, escolheu, a gente gosta. Foi gratificante”, salientou.
2º sargento aposentado Moacir Gregório atuou em Presidente Prudente
(Foto: Stephanie Fonseca/G1)
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Incentivo
Os cinco irmãos – Moacir e mais quatro – trabalharam na PM, mas nem
todos vieram para Presidente Prudente e um já faleceu. “A gente até
brincou que dava pra fazer um time de futebol de salão, quatro na linha e
um no gol”, brincou.“Na verdade, parece até meio que hereditário. Eu via meu pai que sempre chegava com o jipe em casa e falava ‘Vou ser polícia, vou ser polícia’. Aí depois o irmão mais velho entrou e a gente seguiu a mesma carreira”, lembrou Moacir. “Aí depois o filhão pegou a mesma carreira e a gente fica contente, embora que o mundo de hoje está bem difícil, com a criminalidade bastante alta, bastante perigoso. A gente está sempre com bastante vivacidade, Deus à frente, um pouco de sorte e se tudo correr bem, vou ver meu filho se aposentar também”, apontou.
Moacir está indo para oito anos de aposentado. “Eu sou o recruta de aposentado”, disse ao G1. “Mas graças a Deus puxei 31 anos e me aposentei. Costumo falar que eu fechei com chave de ouro”, salientou.
Roodney Gregório começou como temporário na PM (Foto: Polícia Militar/Divulgação) |
O mais novo a assumir a farda militar é Roodney, de 30 anos. “Graças a Deus eu herdei essa profissão do meu avô e do meu pai. É um sacerdócio, é bonito demais”, declarou ao G1. “Entrei em 2005 como temporário na Polícia Militar. De 2005 a 2007. Aí saí, fiquei um ano fora, 2008, e retornei em março de 2009. Em março de 2010 ingressei efetivamente na Polícia Militar e fiz escola de soldado em Araçatuba. Assim que me formei, em março de 2011, fui pra Campinas, onde eu fiquei dois anos e um mês, aí consegui ser transferido pro 25º BPM/I, que é sediado em Dracena, e trabalhei em Pacaembu. Fiquei três anos ali até ser transferido para Presidente Prudente no ano passado”, relatou o soldado.
“Desde criança eu ia brincar e queria ser o polícia da história. Na primeira oportunidade que eu pude fazer o concurso eu já tentei e fui tentando até passar”, contou Roodney ao G1. “[Perguntava bastante coisa] para o avô, para o pai… Eu ouvia as ocorrências que meu pai contava, via matérias no jornal, reportagens, recortava e guardava comigo sempre que estava a foto do meu pai ou o nome dele em ocorrência, ele parava em casa de viatura às vezes para tomar uma água, um café. Então influenciou”, relatou.
A admiração desencadeou um sonho em Roodney. “Uma das minhas realizações de sonho foi trabalhar com meu pai. Foi na guarda do quartel, quando eu era temporário. Ele era comandante da guarda da equipe e trabalhar na equipe dele foi uma satisfação muito grande”, declarou. O trabalho foi por cerca de um ano, em Presidente Prudente.
Roodney Gregório é soldado efetivo na PM (Foto: Stephanie Fonseca/G1) |
Porém, muita coisa ruim também acontece. “Infelizmente, bem mais coisa ruim do que coisa boa. Em cidade menor a coisa é mais feia, pois tem menos recurso. Igual, eu trabalhei em Pacaembu, ali não tem Resgate, então tem que vir de Dracena ou Adamantina. Então, se tinha um acidente lá, muitas vezes vítima muito grave, tinha que esperar. Aí a gente, policial, está ali e não tem muito o que fazer. É difícil”, comentou ao G1.
“Uma vez, na virada de ano, um carro atropelou uma moça. Eu estava de serviço, a gente escutou o barulho, pois estávamos próximos atendendo outra ocorrência de acidente de trânsito. Falei ‘Cabo, vou lá ver’. Cheguei lá e vi a menina agonizando. Não tinha muito o que ser feito. Fui afastar o pessoal ali, não sabia da gravidade, porque não dá para mexer nela. Acionei o Resgate, vinha de Adamantina, e até chegar”, lembrou. “A gente chegou a fazer contato com a Santa Casa para saber se a gente podia ir lá, só que já estavam atendendo a vítima do outro acidente e não dava, só tinha um médico. Aí ela faleceu”, contou.
O atropelamento ocorreu em 2014 e vitimou a adolescente Ana Clara Zorneck, de 16 anos. Ela comemorava o Natal com amigos, quando um carro foi na direção dos jovens e atingiu a menina, que foi arremessada a cerca de 15 metros do local da batida. O motorista fugiu. “Tinha o trevo novo na cidade, ele fugiu, capotou o carro lá e foi para o mato. Ficou homiziado no mato. A gente fez buscas lá, mas estava muito escuro”, contou.
Entre bons e maus fatos, a paixão pela profissão não muda. “Tenho muito orgulho de ser policiam militar, coloco a farda todos os dias com um orgulho tremendo. E se Deus quiser vai ser assim até aposentar”, finalizou Roodney.
Família Gregório serviu e serve a Polícia Militar em
Presidente Prudente (Foto: Stephanie Fonseca/G1)
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